“Sou criança no presente carregando um delírio
da mais profunda razão:
Libertar a verdade dos muros da prisão
Todo dia Liberdade pro juízo da Nação”
O trecho acima foi retirado do Samba-enredo do Desfile do 18 de Maio que acontece todos os anos em BH para “celebrar” o Dia Nacional da Luta Antimanicomial, e que, por razões que todos conhecemos, não sairá em 2020. Coloquei a palavra celebrar entre aspas porque o que acontece naquele espaço vai muito além disso. É um manifesto em forma de arte que exige que os designados “loucos” mantenham seu status de cidadãos.
Podemos pensar a Saúde Mental por seus diversos aspectos: psicológico, biológico, social e político, e é nesse ponto que o Desfile se destaca. Trata-se de uma construção coletiva que envolve todos os atores que fazem parte de uma rede de cuidados,e tem por objetivo dizer à cidade e aos seus governantes: “Nós existimos, e não aceitaremos nenhum retrocesso!”. Enfrentamos hoje no Brasil graves ataques às instituições democráticas, às liberdades individuais, além de um projeto sistemático de precarização dos serviços públicos, inclusive da Saúde. Os pacientes com transtornos mentais pertencem a um grupo de pessoas extremamente vulneráveis, seja pelo estigma, pelas precárias condições socioeconômicas, pela falta de um suporte familiar e social adequados, e provavelmente serão um dos grupos mais atingidos.
Não é possível defender a garantia de direitos e tratamento digno para essa população sem defender o Estado democrático de direito, um Sistema Único de Saúde robusto e políticas públicas que prezem pela equidade. Sem democracia, sem a possibilidade de livre pensamento ou tolerância à diferença, não há terreno para uma Luta Antimanicomial.
Voltando ao samba-enredo, o recado é claro: “Não vai ter perdão pra desonestidade da razão
A loucura vem cobrar
mas a história é quem vai te castigar”
